A FIDELIDADE DE FIEL E A MINHA INFIDELIDADE
Antonio Possidonio
Sampaio
Quem na vida não
cometeu algum tipo de infidelidade? Você não? Pois eu já. Meu remorso pela
mancada foi inclusive tornado público, apesar de não ter certeza de que alguém
disso tenha tomado conhecimento, pois a minha confissão está em Andanças na
Contramão, meu último livro, esgotado no dia do lançamento e de edição pequena.
Mas voltemos à
infidelidade, palavra que os politicamente corretos acham que deveria ser
banida do dicionário, assim como o professor de direito penal Ney Moura Teles
entende que o conceito de "mulher honesta" deve ser riscado do Código
Penal.
Mas como o
conceito de infidelidade se ajusta à esfera moral e não à jurídica, com licença
dos jus-filósofos, continuo entendendo que qualquer pessoa está sujeita a
receber a pecha de infiel por este ou aquele motivo moralmente reprovável.
Fiel mesmo de
verdade só conheço um. Ele é freqüentador assíduo do Parque Antonio Flaquer,
mais conhecido como Ipiranguinha.
Na minha
caminhada mututina da última quarta-feira de cinzas, lá estava ele, aguardando
por seus companheiros de caminhada que geralmente chegam ao parque por volta
das seis e meia. Às seis, Fiel já era notado nas imediações dos equipamentos
para alongamento.
Nessa quarta de
cinzas, Fiel estava mais inquieto do que de costume, talvez por que seus
companheiros não tenham ido caminhar durante o carnaval ou por outro motivo
qualquer. Cheguei a fazer-lhe alguns agrados como estalar os dedos e esboçar
sorriso de amizade e reconhecimento, mas nada disso funcionou.
Só com a chegada
do Paulo, aquele nisei simpático que cumprimenta todo mundo com um caprichado
bom-dia, Fiel sossegou. Correu em direção ao amigo, que o cumprimentou com um
delicado toque de mão direita na pata esquerda que Fiel ergueu com estilo que
os portadores de pedigree raramente possuem.
Pois é, já
confessei no referido livro que fui infiel e acometido de remorso quando
substituí o Parque dos Amores, mais conhecido por Duque de Caxias, pelo
Ibirapuera. E agora, em reincidência, troquei provisoriamente o Parque dos
Amores pelo Ipiranguinha, não só pelo fato de o Duque passar por reformas, mas
e principalmente por me sentir tão bem presenciando as lições de fidelidade de
Fiel por seu amigo Paulo.
Não tenho
intimidade com Paulo nem sei o nome do seu simpático cachorro. Se fosse meu,
certamente o chamaria de Fiel. O que você acha?
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