quarta-feira, 28 de novembro de 2018

Uma greve esquecida




Com certo orgulho, ando a repetir que estudei numa boa universidade, a USP, mas me formei de fato na luta dos trabalhadores metalúrgicos do ABC, em cujo Sindicato trabalhei cerca de trinta anos.
Este nariz de cera para lembrar de fatos históricos de grande importância envolvendo os referidos metalúrgicos, que realizaram entre, 1978 e 1985, quatro grandes greves entre outras menores ocorridas no mesmo período: a da Scania, em 78; a dos peões, em 79;  a dos 41 dias, em 1980, e a “vaca brava”, de 1985, a mais longa do período, com duração de 54 dias.

A histórica greve da Scania, conhecida como a “de máquinas paradas e braços cruzados”, em seu 20º aniversário, foi tão lembrada que mereceu até um caderno especial do Diário do Grande ABC.
Já a greve dos peões, ocorrida em março de 1979, teria passado em brancas nuvens, se o jornalista Ademir Medici, do Diário do Grande ABC, não houvesse registrado em sua coluna Memória, o dia-a-dia da paralisação, baseado no livro “Lula e a Greve dos Peões”.

A greve de 1980, tão importante pela duração reveladora da capacidade de resistência dos metalúrgicos da região, ao que parece também está fadada ao esquecimento. Eclodida a 1º de abril, durou até 11 de maio de 1980, após a prisão de vários de seus líderes como Lula, que em seguida se destacariam com políticos. Na eleição de 82, por exemplo, Gilson Menezes, líder da greve da Scania, foi eleito prefeito de Diadema; Djalma Bom um dos líderes das greves de 79 e 80, elegeu-se deputado federal com 164 mil votos. Lula, candidato a governador do Estado, não foi eleito, mas alavancou a legenda do PT, fundado havia dois anos.

Como se vê, um acontecimento social, político e econômico tão marcante, vinte anos depois é totalmente ignorado pela imprensa, inclusive a local, que tanto espaço dispensou às referidas paralisações.

No seu livro “O ABC da Classe Operária” (Hucitec, 1980), sobre a greve esquecida, o prof. Octavio Ianni assegura: “A verdade é que a greve do ABC, em 80, marca o início de uma nova época no desenvolvimento do processo político brasileiro. A questão da democracia foi recolocada pela classe operária de uma forma surpreendente, tanto para setores burgueses e liberais das oposições como para os próprios governantes. Toda a farsa da ‘abertura’, do ‘novo pacto social’, da democratização de cima para baixo, da reforma das instituições políticas para manter a classe operária e o campesinato fora do poder, tudo isso foi desmascarado pela greve, pela maneira pela qual o governo militar e os empresários atuaram”.

Tribuna Popular - 2000

Temos as cdiddes que merecemos?



Para mim elas representaram tudo: aprendizado, sobrevivência, realização de sonhos e também desilusão.
Nasci na roça, onde morei até os dez anos, quando me mudei para um lugarzinho com menos de mil habitantes; na seqüência, pra outro maiorzinho, sempre sonhando com lugares maiores, metrópoles, onde quem sabe os sonhos sugeridos pelo rádio que na época, meados dos anos 40 não deixava dúvida ser o Rio de Janeiro.
E antes de completar dezoito, peguei um ita no Nordeste com destino à Cidade Maravilhosa, mas durante a viagem o acaso mudou meu rumo e acabei esbarrando em São Paulo, que no final da década de 40, era conhecida como a Terra da Garoa.
Após o espanto do tabaréu na “cidade que mais cresce no mundo”, como então se alardeava, comecei a perceber que na cidade grande prevalecia a lei dos espertos, requerendo peito e coragem para sobreviver-se. E assim procedi. Foram exercícios necessários para a conquista da cidadania plena, a partir de quando me conscientizei de que tudo vale a pena, quando a alma não é pequena, conforme Pessoa havia proclamado.
E esbarro com esse nariz de cera que não me permitiu dizer tudo o que pretendia, neste espaço limitado imitando a lógica dominante nas cidades grandes, cada vez limitando mais o espaço desejado.
E assim, faço minhas as palavras de gente que como eu ama as cidades:
Milton Santos: “O homem de fora é portador de uma memória, espécie de consciência congelada, provinda com ele de um outro lugar. O lugar novo o obriga a um novo aprendizado e a uma nova formulação.”
Joseph Rykwart: “Será que também temos as cidades que merecemos?”
Eis a pauta esquecida, que urge ser retomada. E a propósito: o que aconteceu com o projeto Santo André Cidade Futuro, menina dos olhos do saudoso Celso Daniel?

Antonio Possidonio Sampaio
2004